domingo, 1 de julho de 2007

Meus doces vícios.

Mais um trago daquela cachaça de terrível gosto. Descia amarga, levando consigo os sentimentos que eu tentava afogar. Agora as vistas estavam embaçadas. Já não tinha os reflexos de antes, mas não tinha, também, os mesmos sentimentos. Estavam engolidos, afogados, inebriados com este sorriso alcoolizado. Recebia abraços mil, e me sentia um cara de sorte, pois com o efeito, eu já não via o vazio. Uma piada, muitos risos e outra dose quente ardendo garganta abaixo. E cada vez mais a realidade se confundia com todos os meus sonhos. É como se tudo estivesse dando certo, não me recordava nem o porquê da tristeza de outrora.
Outro gole de alegria descia-me a goela, e queimava minhas lágrimas. Uma boa música tocava ao fundo, mas eu não conseguia me focar no som. Via a tristeza longe, muito longe, e agora eu só queria saber daquele momento de liberdade há muito não experimentado. Já não sentia a fome do meu próximo. Já não sentia o frio vácuo em que estava instalado o meu peito. Já não sentia o desapontamento pelos planos incendiados. Um cigarro proibido é aceso. A fumaça me entorpece, e o riso agora é fácil. O gosto ruim da cachaça já não é lembrado, pois aquele cigarro de gosto forte a cobria. O amargo das lágrimas engolidas também é esquecido por hora. Apenas esse riso bom, desses que a gente demora muito pra poder largar, que não vem de forma natural. Esse riso é tão falso quanto essa realidade em que me vejo. O riso toma o lugar da lágrima que deveria estar caindo neste exato momento, mas, com uma teimosia tamanha, não se deixa cair. Outra dose que acompanha mais um cigarro. A essa altura eu já não sinto meu corpo. “Está quase na hora”, penso. Hora de que? De voltar para casa e constatar que a realidade voltou. De deitar no travesseiro e esperar que meus pensamentos me libertem. De sentar e esperar o tempo passar, num passe de mágica e me devolver meu coração sadio.
Mais uma dose vem, mas eu já não sinto mais a vontade de virá-la. Tenho vontade de ir para casa e chorar muito, pois me vem a certeza de que estou me enganando. De que estou me utilizando de fúteis válvulas de escape, que me devolvem toda a minha tristeza assim que se vão com seus efeitos. A contragosto, ainda engulo a dose ardente. As piadas já não fazem mais sentido. Os risos já não vem com freqüência. Estou perdido em minha própria mente, buscando respostas complexas para problemas simples. A vontade de ir embora ainda vinga, mas a coragem para fazê-lo é suprida pela coragem de enfrentar meus problemas. Vou para casa com a mesma tristeza, apenas um pouco tonto, mas com a companhia da mesma solidão que me acompanha esses dias. E me entristeço, pois consigo constatar que hoje eu supri todos os meus vícios, mas nenhum de meus sentimentos.
Agora deito na cama, milhões de pensamentos rodam junto com minha cabeça, e eu ainda tenho tempo pra pensar se é esta mesmo a resposta certa. Mas qual era a resposta?
Ah, complexa demais, não tenho cabeça pra pensar isso agora – é meu ultimo pensamento até que o sono me tome.

Um comentário:

º° Bibian °º disse...

o mais legal nesse texto de Rafa, eh o inicio! HAHAAHA

brincadeira, ta lindo, como sempre =D