quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Roma


Noites de frio no terraço do meu prédio. Lá em baixo as cores dos carros que correm num frenesi como se os minutos fossem dilacerar o peito. Me pego outra vez pensando em nossos momentos, e como era bom a vista aqui do alto ao seu lado. Talvez agora, onde você esteja, tenha outra paisagem, outro cheiro, outra brisa no rosto e, outra cabeça em seu ombro.
Mas sempre haverá o mesmo coração saltitante, quando você chega com aquele pote de sorvete e o nosso filme favorito. Sempre haverá seu lugar do lado direito da cama, me puxando o coberto madrugada a fora. Haverá as tardes distantes, onde só o telefone aliviava nossa saudade. E ainda assim, por mais que tudo mude de lugar, haverá você e eu, num lugar distante, chamado memória.
Por que sei que não adianta, servir duas taças de vinho, nem acender a lareira. Não adianta mais juntar os quebra-cabeças que compramos no ultimo Natal, por que eu sei que a Torre já foi destruída. Os sonhos que fizemos já foram abalados, e todas as horas em que me pego pensando em você, eu sei, sempre será passado.
Envolvo-me no meu abraço, e fecho os olhos tentando lembrar-me pela ultima vez de todas as coisas boas, como um ritual. Quem sabe assim, se eu der fim nisso tudo, eu não mude e não me cure de você? Mas eu não sei sequer, se quero me curar se, saberei continuar sem nossas lembranças, tão minhas agora.
Volto a casa, sento-me no sofá de canto, do mesmo jeito que você costumava fazer. Seguro o telefone nas mãos, e lá dentro do peito, aquela vontade, quase prece, de que você me ligue, pergunte como estou. Ou apenas diga que foi engano. Faço de sua voz meu porto-seguro, e mesmo sabendo que é devaneio meu esperar por estes momentos, eu continuo assim, seguindo contra a maré.
As horas vão se passando, o barulho dos carros já diminuiu, e o sol vai despontando por detrás dos outros prédios. Mais uma noite passei sonhando acordada. Mais uma noite passei pensando em você. Agora o café forte e amargo me liberta desse transe, me trás pra vida real. O dia será longo, e a cada minuto em que puder minha mente irá se lembrar de você, fazendo meu coração bater mais rápido e apertado. Acho que ainda amo você.

º° Bibiann °º


domingo, 21 de outubro de 2007

Suspiro


Gosto amargo na boca. Mais uma noite perdida em seu sofá de couro branco. Manchas de vinho tinto e restos de comida na mesinha central. Fôlego de fumante é o terror das manhãs de domingo. Precisa de água.

Abre a geladeira, e tem a impressão de que todo mundo cabe em muito gelo e nada de água! Uísque barato de beira de estrada. Mas a dor de cabeça e o enjôo... Não, estava mesmo só e naquela cidade, ninguém poderia interceder.

Tinha apenas vinte anos, mas já penava sob as dores de um mal de amor. Se é que tudo aquilo fora amor de verdade. Não sabia, pois o futuro ainda não trouxe as respostas. Queria apenas cessar a tosse, acender um natural e, observar a fumaça sumir por detrás das cortinas azuis de algodão.

Calor que fervia os miolos, fazendo coágulos de sangue por debaixo de sua pele. Mais uma vez pensou em água, queria um banho. Chuveiro frio, forte e tempo vagaroso. Quase uma bruma... Fechou os olhos e ouviu a porta bater na sala.

Aquela música dos anos setenta, justamente da época em que não se lembrava, pois não havia sequer nascido. O balanço da canção trazia uma saudade do que não se conhecia, do que não existia. E todo espaço fora invadido melancolicamente por aquelas notas sofridas e boas de ouvir.

Fechou o chuveiro, enrolou-se na toalha branca. Pensou que poderia passar os seus últimos dias de vida dentro daquele banheiro frio. Em posição fetal, no chão, como criança que perdeu o rumo do nada, sentia que tudo estava acabado. Ouviu a voz chamar seu nome, tinha pressa. Levantou-se devagar, como quem sentia dores na alma. Pensou talvez que poderia segurar no pulmão o passar dos minutos. Inútil tentativa.

A voz agora gritava nervosa. E dizia verdades de quem também sofria, por erros alheios e irrevogáveis. Estava mesmo tudo findado. Lágrimas não adiantavam. As mãos fugiam, não mais acalmavam. Os braços agitados não cabiam mais no seu abraço. Dor e medo.

Bateu a porta, não disse adeus. Os passos nas escadas selavam o que a mente há tempos já dava sinal. Precisava sumir fechar-se em sua toca, trancar as portas para o mundo e internalizar tudo o que era essencial. Não chorou, gritou. Não penou, agradeceu. Não sorriu, mas criou a sua liberdade depois de sua intensa reflexão. Rabiscou num papel o endereço, deixou as chaves em cima da mesa e saiu. Para nunca mais voltar para aquela voz.


º° Bibian °º

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Porta-Mangueira


Quando o galo cantou, eram cinco horas da manhã de um sábado. Sábado de carnaval, morro da Mangueira, cidade do Rio de Janeiro. Ela forçou os olhos, sentiu o peso das pálpebras como se houvessem coladas umas nas outras. Esfregou com a ponta dos dedos e bocejou esticando as pernas.

A garoa que caía lá fora, levava lama às ruas de baixo. As pessoas iam subindo devagar, carregando suas fantasias da noite anterior, pulando entre as poças, sorrindo com seus poucos dentes. E da janela ela via também as bandeirolas que dias antes, ajudou a colocar por toda favela.

Lembrou de quando era criança, sonhara um dia ser Porta-Bandeira da escola que a vira nascer. Pensou no quanto seu pai havia trabalhado fazendo bicos como pedreiro, nas casas que ficavam lá em baixo, no asfalto, perto do mar. Tudo era para um dia poder desfilar e mostrar o quanto era talentosa.

Levantou da cama, que ficava num espaço pequeno entre o que chamava de quarto, e que servia também como sala e cozinha. Preparou um café forte, não tinha leite, mas já estava acostumada. Ainda restou um pão do dia anterior, rasgou-o entre os dentes fortes e engoliu junto com o amargo.

O dia já começava a dar suas primeiras cores sob os raios de sol, e sentiu um frio na barriga. Foi então que se deu conta; estava mais perto do que ela imaginava. E agora não sabia lidar com o momento tão esperado.

Varreu a porta de entrada, e botou um disco de samba pra tocar. As crianças corriam entre os becos, subindo e descendo, era festa, era carnaval! Pensou em ir à praia, mas de certo tomaria muito tempo, ela queria sentir cada momento ali, na sua toca. Então fechou-se e lentamente, ensaiou uns passos que iria usar à noite.

E quando percebeu, o samba havia-lhe tomado à alma, e todos os sons eram as batidas do seu coração. Já ouvia os gritos que viam das arquibancadas, e a vibração da bateria. Não queria abrir os olhos, tinha medo de que aquele momento escapasse de sua vida, como um suspiro no fim da tarde.

Chorou, e agradeceu à Iansã por estar firme, representando sua escola, e sua família. Pensou em seu pai, e no quanto ele estaria feliz se estivesse ali. E pensou até que, ele realmente estava; em emoção.

O suor caía-lhe pelo rosto, inundando seu vestido tão brilhante, e foi num estampido que o suor misturou-se com o sangue do seu peito. E a formosura desabou na avenida, sem desmanchar seu sorriso. Ela ajoelhou, abriu os olhos e viu, era mesmo verdade, e estava feliz.

A manchete do jornal no dia seguinte homenageou a mulata formosa, que partiu feliz, como sempre desejou, no meio da Sapucaí. Sua escola não foi campeã, mas certamente, ninguém esqueceria daquela noite estrelada, pois era sábado de carnaval.



º° Bibian °º

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Existe um Lugar


Existe um lugar em que a democracia é falha.

Em que crianças não brincam em condomínios fechados.

Existe um lugar no qual o esgoto ainda corre em céu aberto, os jovens não vão à escola, e os doentes não são igualmente respeitados.

Existe um sistema que desumaniza nossos irmãos de raça.

Que desrespeita as mínimas condições aceitáveis de vida digna.

Existem pessoas que tiram da dor o motivo pra sorrir.

Que convivem com anos de segregação.

Que não conseguem falar, pois não tem voz.

Que não conseguem agir, pois as pernas já estão fracas.

Existem pessoas que não podem reclamar suas insatisfações

Que são tratadas como pequenas marionetes em épocas de eleição

Que não tem respeitados os seus direitos de ser humano.

Que são absurdamente espancados, mutilados e assassinados.

Que são desrespeitados, humilhados e mal pagos.

Existem roncos de fome que são ignorados.

Existem pedidos de ajuda que são negados.

Existem hospitais que assistem a mortes nos corredores.

Existe a fome nesse lugar.

Existe a frustração, o ódio, o rancor...

Existem muitos funerais, muitos abraços e muitas lágrimas.

Muitos velórios, muitos pêsames, e muitos desabrigados.

Existem pessoas que choram por não entender o que fizeram.

Para desmerecer as oportunidades que eles vêem que alguns têm.

Existem pessoas que sofrem com a falta de sentimentos.

Que desconhecem o que é amar, gostar, sorrir.

Que convivem todos os dias com a morte os olhando.

Existem pessoas que não recebem abraços, olhares, atenção.

Que estão acostumadas a um governo hostil...

Se você desconhece esse lugar,

Seja bem vindo, esse é sim o seu Brasil.


Rafael Loiola

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Arsênico Letal


Eu, ser plenamente vencido
Pela sociedade abastada e avarenta,
Vivo pelos becos escondido,

Não mais tendo a proteção da placenta.

Sou um corpo emurchecido
E uma massa encefálica degenerada.
Aquele serve ao espírito como abrigo

E esse à alma por morada.

A sorte - um felino finado; E os vícios...
A incontrolável delinqüência,
Deixam na epiderme indícios

Que desmentem a minha falsa aparência.


Um lutulento lupanar é o caminho
Percorrido pelo meu cadáver convulso.

Como um estranho pássaro no ninho
Constantemente me auto-expulso.


Potencialíssimo esquizofrênico:
Quero das turbas me afastar;

Propenso a ingerir arsênico:

Posso isolado, lentamente finar.


-|- Leo Rosário -|-


De todo carinho, respeito e admiração, meu muitíssimo obrigado.
Bibian.

domingo, 23 de setembro de 2007

Inspira-ação


No momento em que a inspiração foge, é preciso respirar fundo. Tão fundo a ponto de sentir o pesar dos dias. Por mais que a cada hora, cada segundo a mais, só aumente a aflição.

Então não há o que fazer a não ser esperar. Esperar a água ferver enquanto você decide entre café ou chá. Esperar o fósforo queimar até o fim, antes de acender o ultimo incenso, e o primeiro cigarro. Esperar pela morte do amor, sentenciada pelo outro, a quem você menos espera. E de quem você mais precisa.

Pensar num tema é algo paradoxal. Pode-se falar de dor, da vida, de amor e de alegria. Mas sempre se escolhe falar das alegrias que a vida trás depois das dores de amor. Torna-se um alienígena dentro dos seus próprios conflitos.

Afinal, não seriam conflitos se fossem fáceis, seus temores. Mas ainda assim, é preciso insistir na mentira de um final feliz. Porque do homem nada resta se lhes retirassem todos os sonhos. Inclusive os seus piores pesadelos.


º° Bibian °º

domingo, 16 de setembro de 2007

Os anjos que foram expulsos do paraíso.


Reza a lenda que até pra morrer eles foram juntos. Foram tantos anos de amizade que agora era difícil lembrar quando se conheceram. O que se sabe é que aqueles dois eram quase inseparáveis. Eram ainda guris, desconheciam muitas malicias da vida – sendo a provável causa de sua aproximação iminente. Conforme passava o tempo, começaram a descobrir-se completamente diferentes. Muitas de suas idéias eram se não divergentes, contrárias mesmo. Mas, mesmo assim, começaram a se divertir cada vez mais juntos. Um era o extremo simples. Não ligava pra coisas materiais e vivia brigando com o outro por isso. O outro era meio adoidado. Um amava o reggae, o outro gostava dum rock. Eram muito próximos da total divergência de pensamentos. Mas não havia jeito, eram quase inseparáveis. As pessoas na rua comentavam a amizade e a ligação era tão forte que eles chegavam a ter um tipo de telepatia, era como se o pensamento de um passasse a ser altamente compreendido pelo outro, dispensando-se palavras. Conforme cresciam, o sentimento tornou-se tão forte que um podia sentir quando o outro não estava bem. Passaram a gostar da diferença do outro o que era muito importante, pois não procuravam moldar-se para a aceitação mútua. Sentiam-se livres para ser como gostavam, pois não seriam julgados por isso. Passaram a almejar coisas parecidas. Apesar da proximidade com a criminalidade, sonhavam em sair de perto da mesma. Qualquer coisa era motivo para que os dois se encontrassem nem que fosse pra jogar tempo pro ar na praia próxima à residência de ambos. Descobriram-se inúmeras vezes caminhando na rua, sem destino enquanto a conversa enveredava por caminhos que só os dois conheciam. E assim foram indo, até que a vida com uma de suas lições impiedosas começasse a brincar um pouco com eles. Um dos amigos teria de mudar de bairro. Os tempos de muita farra e muita cerveja iria ter de ser limitada aos ridículos finais de semana. Eles não eram acostumados a esse limite, por isso sabiam que dariam um jeito de estar juntos sempre, de qualquer forma.
E em mais um dia de farra, naquele velho e bom Gol, a 130 por hora (como já era de costume), eles conheceriam o tamanho da amizade deles. Ainda não conseguiam entender como aquele carro aparecera sem ser notado por nenhum dos dois. Pra encurtar a história, um terrível acidente de carro. Essa é a parte conhecida da história. Segundo se conta, depois, subiram os dois ao encontro do Todo Poderoso. Diz-se que Deus, num voto de confiança, levou-os pro paraíso. Mas não conseguiam se desapegar da irmandade, e quando se juntavam até no céu aprontavam. Era um tal de dormir em serviço, de fugir pra dar uma volta na terra, de sair pra ficar conversando na sombra das árvores. Deus, ciente da situação não sabia se ria ou se castigava os dois, afinal, uma amizade pra sobreviver à morte não se via todo dia. E ia deixando eles lá, fazendo vista grossa por que, na verdade Ele achava aquilo muito bonito. Mas, cansado das queixas dos anjos, Deus manda os dois em reencarnação, desta vez um em cada canto do mundo. Muitos achavam que até Deus enjoara de tanto gostar e queria separar os dois. Mas não teve jeito. Para provar o quanto era grande o sentimento, os dois nasceram viajantes. Um, filho de um capitão da Marinha, e o outro filho de hippies viajantes. A essa altura Deus já havia se esquecido da pequena brincadeira que fizera, quando os dois se conhecem, ao acaso, em uma cidade dessas qualquer do mundo.
E lá, mais de vinte anos depois, Deus um dia bate um olho em dois amigos, sentados na areia de uma praia, olhando o tempo passar, e deixa escapar um sorriso ao pensar alto:
- Hum... Lá estão aqueles dois de novo. – E volta-se para fazer alguma outra coisa.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Mea Culpa


A única certeza de que tenho, é que sou exatamente o que não deveria, não poderia e não queria ser. Mas sou, e isso sufoca minha existência. Devido aos fatos, aos traços, aos laços e tudo mais que me leve ao passado, eu compreendo que esta, não mais sou eu.

O que era antes agora já não sou mais. E é tudo minha culpa. Por desistir dos sonhos, por esperar pelos outros. Por pensar que a vida se resumia a uma dose de uísque e um cigarro no meio da noite. Agora pago mais do que posso, e penduro minhas dívidas nas contas que fiz no o céu. Ou no inferno, quem sabe?!

Talvez se eu pudesse descrever a dor, ou a sensação angustiante a qual me encontro, estaria fugindo e, deixando a responsabilidade de mudança para outro. Exatamente como fiz outrora. Mudei minha vida para uma pessoa em que não me reconheço. Morri, e não fui avisada. Na verdade, suicidei-me.

Purgatório para almas que perambulam. Mas eu só precisava de uma pílula vermelha, e tudo iria mudar. As pessoas em quem confiei, as músicas que escrevi e todos os desabafos em meus diários cheirando a mofo, que apodrecem no fundo do armário. Ali eu me escondo. Mas exatamente por saber, evito-me.

Como voltar a ser quem eu era, se fujo de mim mesma? Por que reclamar do presente, quando também não recorro ao que passou? Encontro-me como em um labirinto de sentimentos. Cheia de dúvidas e certezas. Embora não saiba distingui-los. Apenas sinto, e isso me basta.

Viver tornou-se uma aventura perigosa, onde corro entre esgotos e florestas. Meu suor vale menos que minhas lágrimas, e parece que todos os meus atos são como um jogo marcado. Onde não conheço as regras que aquele ‘eu’ anterior criou. Claro, disso eu também já me esqueci.

Não posso pedir socorro, meu herói morreu antes mesmo de saber de minha existência. Morreu de desgosto, deitado na lama, como porco depois que se refestela numa lavagem. E por mais que tudo esteja absurdamente lógico e sistemático, não conseguirei jamais expressar a verdade.

Penso que o real é tudo aquilo que eu desejo inventar. Então não existe mentira. Tudo o que relato é verdade. Só não tenho, e nem quero provar nada. Não preciso provar nada. Pois a verdade é minha, assim como a dor e toda minha lógica confusão. Sendo assim, não minto nunca, pois toda minha mentira nada mais é, do que a essência da verdade. É aquilo que eu desejo que seja, e será.

Da forma em que te mostro os fatos, crê. E absorves tudo com ânsia de quem tem as artérias entupidas. Limpe os ouvidos, a voz que me fala, grita aos ventos que estou voltando. Basta saber se como sou, ou como era. Mas serei, de fato, eu.


º° Bibian °º

sábado, 18 de agosto de 2007

O Guerreiro Secreto


Foi como sentir a força das ondas, ou como um soco no estômago. Aquela voz, e toda sua presença de espírito, dominavam o ambiente. Soavam como lampejos de trovão, e como o barulho que faz a chuva ao cair nas telhas de barro. Todo o poder que rugia de sua fala, apoderando-se da atenção dos ouvintes, aquele interlocutor austero. Dono e senhor de si. Inflava o peito para gargalhar. E seu riso inundava os ouvidos e sacudiam as paredes do vento.

Todo ser vivo podia sentir a vibração de sua energia. Com pavor de sua sagacidade, as pessoas recolhiam-se entre seus dentes rijos e amarelados. Esperando que a tempestade se pronunciasse, e decretasse qual seria o rumo a seguir. Como uma ordem aos seus súditos, era o imperador presente em seu olhar misterioso.

Por mais frio que fosse, aqueles olhos meigos rasgavam a alma de quem os cruzasse, revirando seus pensamentos e, confundindo-lhes as certezas. Somente ele poderia prever o que os outros escondiam por debaixo de suas máscaras. E somente ele as revelava, toda sujeira debaixo de suas unhas. Sem pudor ou pena, entre um sorriso e outro.

E todo aquele barulho que vinha de sua garganta, era como um túnel escuro e frio, mas que certamente, haveria de encontrar o clarão acolhedor do seu suspiro final. Ainda que sua alma estivesse destinada ao pior dos sentimentos, havia nele uma ternura e um brilho suave. Tão qual a pena mais alva das aves mais raras e distantes. Era como a neve em noites frias. Era como a brisa em manhãs de verão.

Aparentemente cruel, definitivamente humano. Contornava o humor com o medo, dava-lhes o poder de escolha. E tinha a certeza de que todos o escolheria. Era sábio como os antigos, e esperto como o mais hábil viajante. Poderia ser ligeiro em suas decisões, mas era profundo e liderava com avidez suas escolhas por outra tomadas.

Do que ninguém poderá esquecer, certamente, é de sua lealdade àquilo que julga como certo, e de todo modo é, pois assim ele reverte. Transforma e verbaliza. Argumenta em sua oratória, faz com que suas afirmações sejam as mais cabíveis e vigentes. Pois ele sabe que, naquele mundo onde somente ele reina com o poder e a vitória, outro não poderá tomar seu lugar.

Medo sente, pois é mortal, mas não titubeia quando tende lançar-se a cargo de suas batalhas no dia-a-dia. E enfrenta seus adversários com a mesma força com que defende suas certezas e busca saciar dúvidas. Tem em sua volta o mundo inteiro. E por ele, outro mundo a admirá-lo. É inteiramente livre, e sua liberdade o faz brilhar. Filho da Lua, do Fogo e do Ar.


º° Bibian °º


Em homenagem ao amigo Leo Rosário. Parabéns!




terça-feira, 14 de agosto de 2007

Fogaréu


Ela acorda sempre antes do sol. Em sua casa de taipa sem nenhum conforto, longe da água encanada, da luz elétrica e de toda tecnologia da vida moderna, essa Marizinha, que qualquer um encontra no sertão, vive sua vida perto dos bichos e da seca.

Entre seus filhos e a fome, seus sonhos são apenas de sobreviver o máximo possível. Nunca foi à escola, assim também como não irão suas meninas, seu marido e seu futuro. Tens nas mãos calos da roça, dores na alma, e a certeza de que mesmo simples, sua vida é exatamente o necessário para poder descrever o tamanho de suas batalhas.

Andar por léguas até o açude, trazer aquela água salobra, e cozinhar os poucos grãos que a terra lhe deu. Quando os têm. Se não, sobra-lhe a palma de cacto, depois de tirar os espinhos e esquentar bem no seu fogaréu de lenha.

Nos dias em que pode passear, vai até a vila, conversa de comadre entre as vizinhas de estrada. E sente que tudo aquilo é seu mundo. Nada além do que a sorte pode trazer. Ela vive assim, por entre as dores do homem, no peso de ser mulher.

Por tudo o que passou, seus partos, seu sangue derramado entre a caatinga, a Mariazinha pode sorrir quando ouve as modas de viola, e o barulho de chuva que cai de tempos em tempos. Provendo o de comer, nem que seja por uns dias. E na missa de domingo, onde deposita sua fé, pede ao padroeiro que lhe conforte a alma, já que o corpo pesa nos seus trinta e cinco anos. Sente-se velha e cansada.

Quando era criança, sonhava em ser professora, e poder ensinar às outras crianças como o mundo era grande e ia além das cercas que dividiam as grandes fazendas. Sua mãe trabalhava em uma delas. E ela via todas as noites suas lágrimas. Promessas de que tudo um dia ia mudar. E mudou.

Agora ela quem arava a terra, enquanto seu marido moia a mandioca que dava no chão rachado, regado a muito suor. Todos os dias sentia o medo da morte, quando via as carrancas dos bois na beira da estrada. Era como se fosse um deles. Estava sempre a espera de um pássaro preto, para rançar-lhe o coração. E com ele todos aqueles sonhos de felicidade.

Por mais que tentasse, a Mariazinha não sonhava a noite. O corpo latejava as agonias do seu pesar. Arrastava-se por entre os dias, com seu sorriso fraco, sua anemia e palidez, embora sempre tivessem um conselho bom para dar aos mais sofridos. Haveria de haver alguém pior do que ela no mundo. E isso a consolava.

Fizera uma promessa de vida. Ainda que custasse sua alma. Entre o batuque dos Santos, ela girava na roda e dizia para si mesma que seria forte, que permaneceria viva. Para um dia poder contar sua história. Mas não havia história alguma. Nunca dali ela tinha saído. Se não, em seu pensamento.

E cada dia era como um dia qualquer. Era acordar com o cantar do galo, andar até o açude, mas açude já não havia. A seca levara tudo. Levara também a Mariazinha.


º° Bibian °º



Fotografia por: leo rosario

Dicas de Como Ser eu Mesma


Primeiro você nasce. Assim, numa cidadezinha distante, no meio do sertão. Entre pés de cacau e moenda de farinha. Depois tua mãe te larga, nos braços da patroa branca. Como era antigamente, com seus antepassados.

Daí então você cresce rica, com conforto e carinhos. Deixando as outras crianças brancas cheias de inveja e desprezo. Passa a entender que o dinheiro compra os “amigos” e revela suas intenções.

Mais tarde, quando já mocinha, você estuda nos melhores colégios da capital. Freqüenta as melhores lojas, os melhores restaurantes, e sua vida que, poderia ter sido na roça, colhendo cacau e vendendo farinha, transforma-se numa vida cortez de princesa negra. Que nem mesmo as rainhas africanas poderiam dar às suas filhas.

Seus pais se orgulham do seu gosto pelas artes. Na sua classe, é a primeira a ler, a criar histórias e contar com simplicidade, suas férias em lugares distantes. Tens o dom da palavra e, sabe encantar com o sorriso de menina moça.

Os rapazes que se aproximam, conhecem a bravura de uma menina mimada, cheia de vontade, que gosta de chamar atenção. Brinca de bola, anda com os pés no chão, mas sabe seduzir desde menina. Assim, consegue roubar o beijo do garoto mais cobiçado da rua.

Quando termina os estudos normais, você decide virar hippie. Usa saias longas, fala como os filósofos que costuma ler, e, para sua família, é tudo tão encantador, que passam-se os anos e a menina continua sem saber “o que vai ser quando crescer”.

Numa tarde, um vizinho seu adoece, e ao hospital, você envia uma carta desejando força ao amigo. Ele responde feliz, dizendo o bem que aquelas palavras lhe causaram, e indicando a profissão das letras para menina peralta de quase vinte anos.

Decide-se ser jornalista, empenha-se para isso, abandona os incensos e retoma aos livros. Dedicada e inteligente, prevê um futuro brilhante, viajando pelo país, atrás de boas histórias para contar. Seu pai, mais uma vez, enche-se de orgulho de sua pérola negra.

Na faculdade, conhece um outro mundo. Cheio de promessas razoáveis, pessoas diferentes e muito além disso, conhece as linguagens da alma. Vídeos, fotos, letras, sons. Tudo te encanta e revela. Agora você está perdida entre tantos desejos, tantos caminhos. Já não sabes mais pra onde ir. Quer abraçar o mundo todo, e morrer em um pedacinho, com seu sorriso na boca.

Foi numa tarde de verão, em que você decidiu não querer mais nada. Apenas que o tempo parasse e congelasse aquele momento. O barulho dos carros rugia seus ouvidos, as cores, as luzes e as pessoas. Tudo girava ao seu redor.

Correu para pista larga, onde os carros bruscamente freavam. Morreu no asfalto quente, debaixo de um caminhão. E quando sentiu como nos filmes, a câmera rodar, o zoom - in dá ré e vem aquela musica triste no fundo. Tudo fica branco, apenas o estrondo. A próxima cena é você, com sua caneca verde, óculos na testa e uma tela de computador bem na frente. Angustiada com a fumaça do cigarro, enquanto a perna direita está em cima da cadeira, como costumava sentar desde menina.

Documento salvo, agora é mandar para o revisor. Mais uma noite longa entre conhaque, cigarro e Janis Joplin. Que tal ligar para aquele ex-namorado?


º° Bibian °º



Fotografia por: Bibian

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Nó na garganta.


Vivemos época cada vez mais desumana. Nossos irmãos esqueceram-se que a sua inteligência deveria, em tese, humanizar cada vez mais nossas sociedades, tornando-nos aceitáveis entre nós. Os sentimentos, dos quais tanto nos vangloriamos, estão tornando-se cada vez mais obsoletos, e as pessoas só buscam o vazio. Apesar do nosso cérebro desenvolvido, agimos em desacordo quando nos tornamos tão insensatos. Destruímos nosso ambiente em prol do acumulo de capitais, não tendo em mente que nosso irmão tão próximo passa fome.
Estamos nos deixando levar cada vez mais pelo consumismo e pela vaidade, deixando de escutar nossos sábios idosos e escutando cada vez mais a essa mídia aprisionante e parcial. Perdemos nossa personalidade, deixando que a padronização e a igualdade passem a ser cada vez mais comuns e a não absorvição das mesmas resulte em exclusão e desigualdade. Reclamamos da violência, mas formamos governos que tem suas vistas voltadas apenas ao seleto grupo das elites e esquecemos de dar condições iguais de vida. Questionamos a sociedade, mas continuamos cúmplices dessa cultura altamente egoísta. Cometemos o crime de saber, mas aceitar. Os que não tem condições continuam sendo vistos apenas como marionetes políticas que servem de apoio à personalidades corruptas que terminam de destruir qualquer possibilidade de melhoria do país. Somos diariamente assaltados por um igual, assassinados pelo nosso semelhante que já não vê a esperança de melhoria da sua vida.
Somos cobrados a ser iguais, a almejar as mesmas coisas (embora por caminhos diferentes), a ter as mesmas responsabilidades que só terminam de colocar em xeque mais algumas de nossas ideologias igualitárias. Nossa vida tão superlotada de deveres nos esfria a ponto de não termos o sentimento de ajuda ao nosso próximo, por pura ganância. Por isso, precisamos de pequenas desculpas para nosso comportamento egoísta, que visam convencer mais a nós mesmos do que aos nossos interlocutores. Somos todos formadores de uma sociedade limitada, por isso cada bala de um crime é também culpa nossa. Não mais valorizamos os verdadeiros sentimentos, e somos acometidos pelo medo de não ter a responsabilidade de plantar uma relação. Estamos acostumados a maltratar, a não condizer com nossa ilimitada condição de fazer o bem. Estamos mais agressivos, mais alcoólatras, mais fumantes e entorpecidos. Estamos cada vez mais ocultos, surreais, formadores de utopias inalcançáveis. Temos a felicidade, mas viramos as costas, deixando-a partir com seu caminho retilíneo.
Esquecemos que dizer o que sentimos é importante. Esquecemos que não falar também machuca. Não temos mais uma palavra de conforto para aquele que está dormindo na rua e rezando para que alguém tenha caridade bastante para dar-lhe um prato de sopa. Esquecemos que eles também são seres humanos e que também merecem um olhar igual. Esquecemos que eles também sentem dores, que também sentem fome e que não nos custará nada mais que um pouco de tempo para confortar algumas carências. Esquecemos de valorizar quando uma pessoa gosta muito de nós, temos medo de assumir posturas de responsabilidade por um sentimento. Mas é assim, somos humanos, imperfeitos e altamente egoístas. Desejar apenas que isso mude não basta, gritar contra isso apenas não ajudará na mudança, pois uma palavra que não é seguida de uma ação é só mais uma palavra.
Rafael Loiola.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Como Ratos em Bueiros



Mais um trago do café, outro gole no cigarro. Vou cantando os livros e lendo as melodias. No mundo em que já vi de tudo, todo sentimento é pouco. E cada pouco me completa, como se fosse o último. Ultimo momento para ser sincero.

Justificando minha existência, vou gritando em silêncio, e deixando-me ensurdecer com suas lágrimas. Sufocando-me em seus cabelos curtos. Entrelaçando-me nos seus pensamentos.

Vejo surgir nas fumaças, a bailarina pervertida que sua imaginação sonhou. E ela dança, olhando-me com frieza e desprezo. Já não tens mais a voz suave. Agora agoniza pelo corredor escuro.

As lâmpadas fracas, como um filme de terror. As portas estão trancadas, sento-me no chão. Estou sozinha agora.

Correr até o fim do túnel, bater a cara na pedra, e deixar o sangue escorrer entre os cílios. Pois na boca fina, adormece a palavra ‘medo’.

Esperar as cartas que você nunca me escreveu, é um tormento. Torcer para que o tempo voe, mas ele apenas passa, arrasta, divaga em minha mente. Passado e futuro. O presente sou eu e você.

Os olhos agora ardem de ódio, de medo, de pena e de saudades de encontrar os teus. Você sempre soube, e eu não sabia. Que era difícil a palavra amar.


º° Bibian °º

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Do pó ao pó


Peço a ti, que é o fim e o começo.

Que é a dor, a lágrima e a saudade.

Peço a ti, que é o mistério que desconheço,

Trazer de volta meus tempos, sem vaidade.

Clamo ao sono, que leva à eternidade.

Que não distingue preto de branco.

Clamo ao sono, venha sem piedade.

Sangre-me, que mesmo com dor eu estanco!

Imploro, leve-me ao sem fim.

Pois só lá esqueço minha dor.

Minha morada é dentro de mim.

Imploro, estenda sua mão fria.

Em direção àquela bela flor.

E arranque-a com inigualável maestria.



Rafael Loiola

terça-feira, 10 de julho de 2007

A revolta veio com o Tango


Sinto-me como uma dançarina de tango. Em um cabaré que um dia ja foi famoso, mas agora apenas bêbados freqüentam. As lindas mulheres criaram olheiras, os filhos pequenos já choram em seus berços. Apenas os cigarros consomem a dor, e a fumaça se esvai no tempo. São sempre as mesmas lembranças.

O moço alto, jovem e bonito que um dia atravessara aquela porta, volta agora cambaleando, tropeçando no meio-fio. Não mais sorri com dentes fortes, seu sorriso amarelou-se com o tempo. Com suas mágoas, suas dores e seus erros. Todo mundo aqui sofre, mas alguns ainda preferem dividir sua dor comigo.

Como se meu colo fosse um altar, meu útero o cofrinho de fazer milagres, e cada um deles depositam a cada noite, um pouco de suas esperanças. E eu ainda ouço a voz de minha querida mãe a falar, “filha amada, não te deixas envolver por teus amigos. Pois seu coração é como flecha, voa longe e nunca se sabe qual será seu paradeiro. Por mais que tu mires, há de errar teu alvo. Há de marcar a vida de alguém que tu não queres. Há de se ferir com teu próprio jogo, e tomar de seu próprio veneno. Amigos são leais apenas depois que morremos, mas não queira morrer por eles”.

E como música, ouço o choro do futuro, enrolado numa manta verde, ele pede ajuda. Pede para que o alimente com alegria, amor, e confiança. Pois os sorrisos são falsos, as esperanças nos enganam. E tudo o que temos é nosso passado, e é dele que nunca devemos fugir, dele nunca devemos esquecer. Para não vivê-lo outra vez, para não cair de novo, e não vacilar.

Mais um gole de vinho, mais uma noite termina, mais um bêbado dorme por cima da mesa. E mais uma vez, subirei as escadas da vida sozinha, como uma dançarina velha, perdida no tempo. Apenas vinte e quatro anos, mas estes não são bons tempos.


º° Bibian °º

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Liberdade!

- Entra. Não repara a bagunça, mas com toda a confusão não tive tempo de arrumar. Não, não chora não. Respira fundo, e espera que tudo há de se consertar.
O chão estava imundo. Centenas de roupas espalhadas pelos cantos. Nas paredes as marcas da arte infantil ainda eram evidentes. Os poucos móveis que preenchiam o casebre estavam completamente empoeirados.
E assim ela entrou naquele barraco, do qual jamais sairia. Vinha da casa dos pais, tão pobres quanto o rapaz. Menino direito, trabalhador, mas que não descendia de nenhuma condição econômica. Nascera em família humilde, assim como ela. Tinha um trabalho quase escravo numa empresa de transportes públicos. Sim, o nosso José era um simples segurança, que não precisava de mais do que seus trezentos e tantos por mês e de seu trinta e oito para viver bem, na sua concepção. Mas agora as coisas mudariam. Esta mulher (a qual chamaremos de Maria) escrevia, em sua vida, uma historia muito bruta.
- Maria, senta aí. Temos de conversar um pouco – dizia José tentando, inutilmente, disfarçar sua insegurança.
Maria não conseguia dispor de palavras para formar uma frase. Apenas obedeceu ao rapaz, e sentou-se naquele sofá velho. Queria berrar sua insatisfação. Queria estufar o peito e urrar seu desapontamento. Mas ela não tinha forças nem para levantar a cabeça e mostrar o rosto. Sentia vergonha. Sentia nojo. Não entendia por que, mas ela preferia ter sido morta naquele dia.
- Eu sei que agora você não tem condições, mas amanha nós teremos de ir à delegacia para que você preste uma queixa.
Ela não dizia nada, apenas balançava a cabeça negativamente, entre soluços.
- Mas por que não? A pessoa que fez isso com você merece pagar, Maria!
- Eu já disse que não! – berrou a moça e virou o rosto para o outro lado.
A tragédia que aconteceu com Maria já não deve ser mais nenhum mistério. Sim, ela fora violentada. Mas ela não queria que ninguém pagasse por nada. Ela só desejava esquecer aquele maldito dia. De todas as terríveis coisas que a moça já presenciara, aquela era uma das poucas que ela apagaria de sua vida, se pudesse.
O tempo passava e apagava as marcas da violência que a moça sofrera. Pelo menos aparentemente, ela estava melhorando bastante, mas José não conseguia esquecer sua revolta. Tudo o que ele queria era poder se vingar do desgraçado que fizera aquilo com uma menina como a Maria. Mas a garota se fechara de tal forma que era impossível arrancar dela qualquer informação do agressor. José, já sem paciência, terminava por deixar o assunto e ia fazer alguma outra coisa. Mas cada dia mais, Maria se fechava, falava menos, chorava mais... Ou seja, vivia dando sinais de que precisava de uma ajuda maior.
Mais um dia normal começava. Pelo menos era o que achava José. Levantou para tomar café (já havia se habituado a tomar o bom café que Maria preparava), mas a mesa estava vazia. O rapaz estranhou, mas não tinha tempo para pensar demais. Tinha de se aprontar para ir ao trabalho. E assim foi feito. Banhou-se, vestiu-se e, quando saía de casa, sentiu que se esquecia de alguma coisa. Passou a mão pelo cinto e notou a falta de seu instrumento de trabalho – seu bom e velho trinta e oito. Na mesma hora em que deu falta do objeto, um nome ecoou em sua mente:
- Maria! – berrou ainda em frente à casa.
Mas não havia mais tempo. Enquanto adentrava o barraco aos trotes, José ouviu o barulho de liberdade. Invadiu o quarto às pressas, mas a moça estava estirada no chão, com um buraco no meio da testa. O rapaz ainda ficou alguns minutos olhando a cena, sem querer acreditar, quando viu em cima da cama um papel com apenas duas palavras. Ele pega o papel e seu olhar de horror é notado ao ler a frase: “Meu pai”.


Rafael Loiola

segunda-feira, 2 de julho de 2007

A Paixão e seus segredos


O veneno é letal como bala de tiro. O ciúme mata, fere, e cansa. Todo amor se cansa. A paixão queima, e o amor cansa. Cansa tanto que um dia acaba. Seco e só, assim como começou... Sozinho.

No dia em que ela percebeu seu amor, notou também que não se amava mais. E bebia e fumava. Fumava e bebia como bicho acuado, como quem precisava morrer. E morreria por ele, se assim fosse preciso. “A paixão é um inferno, o amor é o Satanás!” gritava ela aos quatro ventos, pedindo a Deus para que lhe redimisse de seus pecados.

Enquanto ela o amava, ele pensava na sua vida como peça de teatro. Ele era o mamulengo, ela a feiticeira. Haveria de saber quem comandava o picadeiro, teria de pedir-lhes ajuda. Era louco por ela. E ela era louca por ele.

Tentou morrer queimada, tentou cortar os pulsos. Mas a cigana velha, com seus cabelos negros, pele seca e dedos largos, lhe afagou o rosto. Sentenciou seu mal, e disse que tudo seria diferente. Ela precisava ser forte, pois a paixão já havia cessado. Ele voltaria de onde viera. Não houve desespero. O amor era tamanho que ela se conformou.

Trovões e raios cortaram a escuridão e o silêncio da noite anterior. Tambores de negros no terreiro ao lado, arrepiavam-lhe a alma. As vozes em coro. Atabaques, batuques, gritos e fogos. O dia não clareava, e a solidão lhe era perversa. Onde ele estaria, se não nos braços de sua amada?

E foi nessa hora de cólera, que sua voz ecoou por toda sala. Esvaiu-se de lágrimas, e deixou seu corpo cair ao léu. Sentiu-se voando, sorriu. O gosto do amor era amargo como sangue. E então pensou que tudo não passara de um sonho.

Acenderam-se as luzes, o público levantou-se. Era mesmo o fim.

Baseado no filme O Vestido , de Paulo Thiago.




º° Bibian °º

domingo, 1 de julho de 2007

Meus doces vícios.

Mais um trago daquela cachaça de terrível gosto. Descia amarga, levando consigo os sentimentos que eu tentava afogar. Agora as vistas estavam embaçadas. Já não tinha os reflexos de antes, mas não tinha, também, os mesmos sentimentos. Estavam engolidos, afogados, inebriados com este sorriso alcoolizado. Recebia abraços mil, e me sentia um cara de sorte, pois com o efeito, eu já não via o vazio. Uma piada, muitos risos e outra dose quente ardendo garganta abaixo. E cada vez mais a realidade se confundia com todos os meus sonhos. É como se tudo estivesse dando certo, não me recordava nem o porquê da tristeza de outrora.
Outro gole de alegria descia-me a goela, e queimava minhas lágrimas. Uma boa música tocava ao fundo, mas eu não conseguia me focar no som. Via a tristeza longe, muito longe, e agora eu só queria saber daquele momento de liberdade há muito não experimentado. Já não sentia a fome do meu próximo. Já não sentia o frio vácuo em que estava instalado o meu peito. Já não sentia o desapontamento pelos planos incendiados. Um cigarro proibido é aceso. A fumaça me entorpece, e o riso agora é fácil. O gosto ruim da cachaça já não é lembrado, pois aquele cigarro de gosto forte a cobria. O amargo das lágrimas engolidas também é esquecido por hora. Apenas esse riso bom, desses que a gente demora muito pra poder largar, que não vem de forma natural. Esse riso é tão falso quanto essa realidade em que me vejo. O riso toma o lugar da lágrima que deveria estar caindo neste exato momento, mas, com uma teimosia tamanha, não se deixa cair. Outra dose que acompanha mais um cigarro. A essa altura eu já não sinto meu corpo. “Está quase na hora”, penso. Hora de que? De voltar para casa e constatar que a realidade voltou. De deitar no travesseiro e esperar que meus pensamentos me libertem. De sentar e esperar o tempo passar, num passe de mágica e me devolver meu coração sadio.
Mais uma dose vem, mas eu já não sinto mais a vontade de virá-la. Tenho vontade de ir para casa e chorar muito, pois me vem a certeza de que estou me enganando. De que estou me utilizando de fúteis válvulas de escape, que me devolvem toda a minha tristeza assim que se vão com seus efeitos. A contragosto, ainda engulo a dose ardente. As piadas já não fazem mais sentido. Os risos já não vem com freqüência. Estou perdido em minha própria mente, buscando respostas complexas para problemas simples. A vontade de ir embora ainda vinga, mas a coragem para fazê-lo é suprida pela coragem de enfrentar meus problemas. Vou para casa com a mesma tristeza, apenas um pouco tonto, mas com a companhia da mesma solidão que me acompanha esses dias. E me entristeço, pois consigo constatar que hoje eu supri todos os meus vícios, mas nenhum de meus sentimentos.
Agora deito na cama, milhões de pensamentos rodam junto com minha cabeça, e eu ainda tenho tempo pra pensar se é esta mesmo a resposta certa. Mas qual era a resposta?
Ah, complexa demais, não tenho cabeça pra pensar isso agora – é meu ultimo pensamento até que o sono me tome.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Berros de Sentimento


Como sorrir?

De que motivos fúteis preciso para enganar essa lágrima que teima em querer rasgar-me?

Por que caminhos estreitos terei que caminhar para esquecer essa solidão que teima em me doer, que teima em me tomar?

Por onde, dentro de minha mente, terei de ir para conseguir enfim me esconder desse vazio, dessas risadas falhas que eu ainda estampo, desses sentimentos que beiram o amargo de tão medíocres?

Infelizmente eu não consigo me enxergar dentro desse padrão frio, pois eu ainda creio na existência dos sentimentos, muito embora eles não tenham me ajudado tanto por esses tempos.

Não consigo me adaptar a esses tempos em que beiram as relações cegas, que não conseguem se mostrar, não conseguem se entrelaçar como se amar fosse algum motivo para se fugir. Gostaria de entender o porquê de ninguém conseguir firmar-se ao meu lado, pois me parece que está tudo torto. É como se o mundo estivesse virando de cabeça pra baixo, e eu ainda esteja teimando em caminhar na direção contraria só que ninguém me entende – e todos esperam que eu volte a caminhar na direção deles.

Gostaria de acertar o caminho para fugir desse sistema sufocante, para que eu possa enfim poder correr atrás da minha felicidade, e fugindo dessa fumaça que teima em querer me cegar, dessa sede por lucros desumanos, dessa selva que eu sou obrigado a suportar – pois neste mundo não se come quem tem fome, não se dá abrigo a quem tem frio, muito menos ouvidos aos que ainda teimam em tentar berrar o erro deste mundo.

Mas como correr atrás de uma felicidade que eu sou impossibilitado de enxergar, pois não sou completamente entendido nas minhas falas dando-lhes um ar de devaneio? Como esperar que as coisas enfim se acertem, se nem quando tenho certeza de que tudo dará certo, a calmaria se vai e uma nova tempestade se instala?

Que monstro é esse que me causei por conta de tantas quedas?

Quantas feridas, nas quais joguei sal e também engoli as lágrimas de dor, terei ainda mais de suportar até que meu caminho seja aberto à liberdade?

Ardo. Mas ardo por que não consigo me convencer que estou errado. Ardo por que não importa quantos planos eu faça, todos se perdem num grande incêndio. Ardo, mas esse ardor, como sempre, vai ser esquecido com muitos e muitos sorrisos tão falsos quanto esse vazio a que me lancei. Ardo por que não posso lutar para mudar, pois sou covarde demais para fugir e corajoso demais para ficar. Ardo, mas este ardor há de passar, essa lágrima há de secar e o meu sorriso – falso, mas sorriso – voltará a estampar meu rosto.


º° Rafael Loiola Sarmento. °º

quarta-feira, 27 de junho de 2007

Uma Noite no 301


-Vamos discutir agora?

-Não, deixe pra mais tarde.

Cinco minutos se passam

- E agora, já podemos discutir?

- Não, já resolvemos nossos problemas.

- Já?

- Sim, eu gosto de você, você gosta de mim. Deite-se um pouco, são 4h da manhã.

E parece que a solidão corrói o peito. O auto-entendimento dói como uma faca que segue cortando aos poucos, cada centímetro de pele viva em seu corpo.

Talvez se notassem seu comportamento cada vez mais suave. Talvez se vissem seus olhos cada vez mais vivos. Talvez... Mas não percebem, pois não existe nada disso. Não percebem por que tudo ali é falso.

Ele acorda sempre ao meio dia. Não toma café, prefere apenas um copo com água. O dia cinzento que ele enxerga por trás das cortinas amareladas, traz um gosto amargo. Cigarros, conhaque, e um vazio enorme em seu peito. A noite anterior foi diferente. Ele sabia que sua vida jamais seria a mesma. E não foi.

Dos seus 25 anos, apenas três o separavam do real e do abstrato. Foi com a turma da faculdade, sua primeira festa no 301. Aquele covil de cobras e escorpiões, todos vivos, esperando seu primeiro deslize. Mas não, ele era atento e sentia que ali, não poderia vacilar.

Foi quando ele viu os cabelos negros mais brilhantes de sua vida. Se ele soubesse o que seria sua vida ali a diante, ele não teria sentado ao lado dela. Não teria fumado o seu cigarro, não teria fumado do seu pó.

Dividiram a cama, dividiram também a saliva, e o gozo ao amanhecer. Era tudo festa, e seus sentidos estavam à flor da pele. Ele apenas queria que o tempo voasse, mas que ela nunca saísse de seus braços. E que todas as noites fossem como aquela no 301.

Naquela manhã cinzenta, ele tomava então sua primeira dose de conhaque, olhava entre os prédios e os carros lá em baixo, via pessoas e podia sentir o barulho da vida. Mas tudo o que ele precisava era voltar àquela noite no 301. A suavidade do toque daqueles longos dedos em seu rosto, e todo cheiro bom de incenso que inundava o apartamento. Havia outras pessoas, mas seus olhos apenas fitavam o brilho que era o olhar negro e firme que havia em sua frente. Ela sentia amor por ele. Era coisa de outra vida.

Quando tudo parecia ser irreal, ela lhe sorriu, com seus dentes insuportavelmente brancos, retos e grandes, como se sua boca fosse a porta do céu, e tudo o que mais existisse de bom no mundo. Sua voz era como a águia sobrevoando o oceano. Segura do que queria, ela lhe disse para ficar para sempre ali, no 301. Precisavam apenas um do outro e nada mais.

E por mais que os segundos insistissem em andar, ele sentia a dor em seu peito, a dor da certeza de que todas as noites e todas as festas que viveu no apartamento ao lado, não seriam jamais como aquela. Como foi e como seria dali em diante. Três anos durou seu sonho. Até que naquela manhã cinzenta, depois de renegar sua necessidade em expor-se, ela partiu.

O viaduto tinha mais de cinco metros de altura, mas a morte corria em baixo, a 120 quilômetros por hora, pesando o suficiente para dilacerar aquele corpo que outrora estava em seus braços. Ela sumiria dentre semanas, debaixo de uma cova rasa e fria. Nunca mais as mechas negras entre seus dedos. Nunca mais aquele sorriso largo. Nunca mais as madrugadas no 301. E já havia passados três anos.

Tomou o ultimo gole do conhaque, respirou fundo e sonhou. A mão que lhe afagava era negra, como toda dor que seu peito sentia. Pediu para morrer, mas queria morrer numa noite como aquela no apartamento 301.


º° Bibian °º

terça-feira, 26 de junho de 2007

Cotidiano


Boa noite.

Ligo o monitor, meus olhos estão embassados...espero que melhore até o final desse texto.
Acordar no fim da manhã, sem dar tempo de almoçar decentemente, prefiro tomar um copo de suco de uva. Muito mais doce do que meu organismo esperva ou desejava. Banho frio, pra dispertar. Enquanto lavo o rosto, o celular toca até "o outro" cansar e desistir. Um bip; ele (seja lá quem for) resolveu deixar uma menssagem. Alguém me pedindo ajuda.
Dou uma passada pela cozinha, minha mãe me diz "boa tarde" e vai descarregando a lista de tarefas do dia. Eu saio institivamente, ja conheço todas as suas falas desde sempre. Volto ao meu quarto, agora sim, sento-me diante a uma tela fria, checo e-mails, notícias. Tudo continua como eu havia deixado na madrugada anterior. Até que um assunto na minha caixa postal me chama atenção. Um e-mail contendo vários endereços postais para enviar curriculum. Sim, eu estou procurando emprego. Seleciono algumas empresas do meu interesse, salvo todo o conteúdo, me cadastro em alguns serviços de RH online. Chega, minha cabeça não pára de pensar. Mas em que? Ou em quem? Nele...Não aquele que me ligou mais cedo, mas aquele em que eu tenho passado horas no messenger trocando opniões e até um pouco de charme, pedindo aos Deuses para que ele note logo meu interesse.
Vou ler um livro, antes, preciso colocar uma foto nova no fotolog. Falar mais sobre minha ida ao interior no feriado. Responder a menssagem que recebi no celular, via orkut. E nesse exato momento, eu me dou conta de como as coisas tem ficado cada vez mais virtuais, frias e distantes. Eu poderia ter retornado aquela ligação, já que a pessoa estava mesmo precisando de mim. mas não hoje, não acordei disposta a ninguém, além de mim mesma.
Dois capítulos do livro é suficiente para quem ja está no meio da tarde, sem produzir nada e com uma fome insistente que me faz perder a atenção dos fatos narrados no romance. Mais uma saída do quarto, até a cozinha. nada na geladeira, além de sobras do almoço (que não me apatecem - adoro essa palavra)e coca-cola. Vamos la, no armário um salgadinho com aspecto de isopor, aenas pra enganar o estômago, esse foi meu almoço.
Volto ao livro, mas ja não me entusiasma mas. Termino aquele capítulo e marco a página com um pedaço de papel. Volto ao computador. Nenhuma menssagem nova, nenhum recado, além dos comentários em minha foto, a que estou com tres amigos, segurando copinhos de pinga. Trivial...O jeito é assistir um filme.
No começo, o idioma alemão é insuportável, pra quem ja se acostumou com inglês e francês. Mas nada que uma boa trama e uma fotografia curiosa de "Adeus Lennin!", não faça deixar isso em terceiro plano. Sinto a noite chegar, com um pouco de frio nos pés. Fim de filme, mais uma coca-cola. Agora sento-me aqui e espero que eu ainda possa ser salva, como ja diria um outro longa metragem "antes que termine o dia".
Em pensar que ontem, havia combinado de sair, ver alguns amigos, beber um pouco, jogar conversa fora...hoje não foi nada agradável. Um dia absolutamente vazio e comigo mesma.

Meus olhos continuam embassados como no início do texto, e agora...(pausa)...tomei o ultimo gole da minha coca-cola. Queria além de um cigarro, ter alguém aqui comigo.




º° Bibian °º

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Ponto de Partida


Começou com o gosto pelo café no início da noite. Sabia que seria longa a jornada madrugada à dentro. Resolveu ir até a varanda, sentir a brisa fria da praia que, vinha com cheiro de chuva. As árvores balançavam e, o barulho dos galhos lhe causava arrepios.

Mas não era importante, não queria sentir o tempo passar, como sentia seu coração bater pesadamente. E o que lhe confortava, era sentir entre os dedos o calor da caneca quente do café. Pensou na água que caia, e imaginou-se no banho. Precisava lavar não só seu corpo, mas, queria sentir-se como a alma limpa.

“Vai ficar tudo bem”, ela pensava. Mas não estava tudo bem, nada ia ser como antes. Não haveria mais os passeios sob a areia fofa, e a água morna do mar a molhar seus pés. Não haveria o sorvete e as risadas nas noites estreladas, nem mesmo as conversas embaixo da sombra da jaqueira. Aqueles dias não voltariam, por mais que ela fechasse os olhos e, sentisse o cheiro de como era bom.

A água escorria fria por todo seu corpo, sentia-se encharcada, e não sabia diferenciar as lágrimas silenciosas com as gotas do chuveiro. Queria gritar, e não podia. Queria correr, e não podia. Ela queria exatamente que nada daquilo tivesse acontecido. Lembrara-se das cartas que costumavam trocar, mesmo com toda tecnologia, gostavam de sentir o cheiro de tinta no papel, e até mesmo um pouco do perfume de suas mãos.

Uma delas, ela havia escrito em uma noite como aquela; fresca e chuvosa. E agora ela sentia que nada mais lembrava outrora, além da chuva e da brisa noturna. Fechou o chuveiro, secou o corpo e as lágrimas e, enrolada na toalha, descalça, foi até seu quarto. Acendeu um incenso, pôs uma musica que costumavam ouvir e, sentou-se na janela com seu maço de cigarros. Ela havia prometido que, após seu aniversário ia largar o vicio. Mas sabia que não teria mais o incentivo de antes, não teria quem esconder-lhe o isqueiro, tampouco quem afogasse seus fósforos. Resolveu deitar, a chuva fina havia começado a molhar-lhe a pele, sentia frio, então.

O incenso já estava no fim, o CD repetia a mesma faixa já algum tempo, e ela estava encolhida na cama, nua por debaixo de sua toalha. Olhos arregalados, pavor! Não queria dormir, não queria sentir o tempo passar mais e mais, aumentando a distancia dos dias. Queria ligar, mas não tinha para quem, queria falar, mas não tinha com quem. Então dormiu. E o dia amanheceu ensolarado.

Eles iam gostar de ver aquele céu. Certamente, o viram lá do alto.




º° Bibian °º